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Câmara e Defensoria realizam audiência pública em defesa de melhores condições de trabalho para catadores de reciclagem

A defensora pública e coordenadora do Nugam, Kaliany Ribeiro, apresentando dados levantados pela Defensoria sobre a realidade dos catadores em Itapetinga

Em parceria com a Defensoria Pública do Estado da Bahia, a Câmara Municipal de Itapetinga realizou, nesta quinta-feira (9), uma audiência pública em comemoração ao Dia Internacional dos Direitos Humanos, para enfrentamento da invisibilidade social dos catadores de reciclagem e apresentação do Programa Mãos que Reciclam da DPE/BA.

Participaram da mesa de debates a defensora pública e coordenadora do Núcleo de Gestão Ambiental da Defensoria Pública (Nugam), Kaliany Ribeiro, o procurador geral de Itapetinga, Anderson Macedo, representando o prefeito Rodrigo Hagge (MDB), o secretário municipal de Meio Ambiente, Fábio Viana, a professora do Instituto Federal Baiano, campus de Itapetinga, Érika Ferreira, a catadora e presidente da Cooperativa de Catadores Itairó, Silvana Bonfim, o contabilista André Dantas, que é fundador da Itairó, a catadora e presidente da Associação de CataIta, Rosa dos Santos e o secretário municipal de Infraestrutura, Gustavo David.

Na abertura do evento, o presidente Valquírio Lima (PSD) falou sobre a invisibilidade social dos catadores e parabenizou a defensora Kaliany Ribeiro pela sensibilidade a esses problemas sociais e pela busca de melhorias de vida e dignidade para esses trabalhadores. “O preconceito é passado de geração em geração. Ele é uma construção social. E, se é construído, também pode ser desconstruído”, ressaltou.

Palestrante da audiência pública, a professora do IF Baiano Érika Ferreira, que é Doutora em Saneamento e Recursos Hídricos, fez uma apresentação para contextualizar o tema e oportunizar a discussão. Intitulada “Lixo e Resíduos Sólidos Urbanos: desafios e possibilidades em Itapetinga-BA”, a palestra chamou a atenção para a importância do tratamento adequado do lixo para o meio ambiente e desenvolvimento de uma sociedade mais sustentável.

Entre os dados apresentados, a professora informou que, segundo a Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública (Abrelpe), em 2020, o Brasil produziu quase 83 milhões de toneladas de lixo, sendo que a média é quase 226 mil toneladas por dia.

Érika Ferreira comentou sobre a situação do lixo em Itapetinga. “Pelas características que a gente vê, não é um aterro controlado. Então, se era, ele regrediu, porque ele apresenta características de um lixão”, apontou.

A palestrante alertou, ainda, que é fundamental que o município tenha um Plano de Gerenciamento de Resíduos, com metas e objetivos de curto e longo prazo. “Esse plano não é só para quatro anos. É para 20 anos; ele é contínuo, porque o resíduo sempre vai ser produzido”, explicou.

A professora destacou que é preciso haver ampla divulgação do plano junto à população, além de ações de educação ambiental formal (desenvolvida dentro das escolas) e não formal (desenvolvida fora do ambiente escolar). Sobre a coleta seletiva, disse que ela tem a vantagem de reduzir o lançamento de resíduos no aterro e, além disso, aumentar a vida útil desse tipo de sistema de tratamento e promover a saúde dos catadores.

Nesse sentido, Érika esclareceu que a contribuição do IF Baiano, na condição de instituição de ensino, frente aos desafios enfrentados no município de Itapetinga, seria na educação ambiental, oferecendo cursos à comunidade e aos catadores, por exemplo.

Perfil dos catadores de Itapetinga

A defensora pública Kaliany Ribeiro revelou que a realidade de Itapetinga é totalmente diferente de outros municípios em que a Defensoria Pública atua junto aos catadores de materiais recicláveis. Na oportunidade, ela justificou a escolha da data para realização do evento, lembrando que o Dia Internacional dos Direitos Humanos é comemorado anualmente em 10 de dezembro.

“A partir desse estudo, nós podemos dizer que os catadores de Itapetinga não são mais invisíveis”, afirmou. De acordo com a defensora, são desviados do aterro, todos os meses, pelas mãos de catadores e catadoras, 100 toneladas de material reciclável, o que equivale à metade de tudo o que é desperdiçado no município. “Em Itapetinga, esse desvio é de quase 70%”, informou. “Vocês são os grandes heróis da gestão de resíduo do município de Itapetinga e, digo mais, referência no estado da Bahia”, declarou, se referindo aos catadores.

Kaliany Ribeiro indicou que são mais de 15 milhões de catadores no mundo. Estima-se que, com quase 35 mil profissionais do ramo, a Bahia tenha o maior número de catadores entre os estados do Nordeste. Outro dado importante é que o Brasil só recicla 2% de todo o lixo gerado.

Em sua apresentação, a defensora também criticou as condições de trabalho dos catadores em Itapetinga. “Quanto vai custar para Itapetinga não ter um plano efetivo de gestão de resíduos?”, questionou. Ela concluiu que não fazer coleta seletiva é igual a gerar desperdício.

Como sugestão para o enfrentamento da situação, a coordenadora do Nugam recomendou que sejam editados decretos instituindo a coleta seletiva nos órgãos públicos municipais e o selo verde de apoio ao catador. Em relação à Prefeitura, a cobrança é acerca da elaboração do Plano Municipal de Resíduos Sólidos.

Kaliany lembrou que, conforme a Política Nacional de Resíduos Sólidos, o material reciclável é bem de valor social, promotor do trabalho e renda e de cidadania. “A Defensoria não pode aceitar que material reciclável seja tratado como mera mercadoria ou bem econômico para gerar lucro para setor empresarial. Material reciclável tem que chegar às mãos de catadores e catadoras”, argumentou.

A pesquisa da Defensoria Pública traçou o perfil do catador em Itapetinga. Os dados mostram que há cerca de 130 catadores na cidade, que produz 45 toneladas de lixo por dia. A estimativa é que 30% sejam de material reciclável, o que leva a entender que o município desperdiça por dia 13,5 toneladas.

“Considerando os dados, são aterrados ilegalmente, porque a legislação não permite que material reciclável seja aterrado, 135 toneladas por mês de material reciclável”, apontou.

A Defensoria Pública entrevistou 109 catadores de Itapetinga e constatou que 89% deles são pessoas negras, 39% são mulheres, 51% têm mais de 40 anos e 86% não terminaram o ensino fundamental. Cada catador desvia por mês cerca de uma tonelada de material reciclável, porém, como eles ainda estão “nas mãos de atravessadores”, acabam tendo uma renda muito baixa.

Para a defensora, a conclusão é de que existe coleta seletiva informal em Itapetinga. Ela espera que, com o apoio da concessão realizada, o município possa pensar em um plano efetivo de segregação e coleta seletiva com inclusão prioritária dos catadores.

Compromisso com a causa

O secretário municipal de Meio Ambiente, Fábio Viana, reconheceu que os catadores enfrentam inúmeras dificuldades. Para ele, a questão não é apenas um problema ambiental, mas também social e econômico. “O compromisso que eu já assumi com vocês catadores, em setembro, e com a própria Defensoria Pública talvez seja um compromisso muito pequeno, mas é aquilo que eu, enquanto secretário de meio ambiente e, principalmente, enquanto filho de Itapetinga, tenho tranquilidade de assumir. É a gente começar a pautar essa discussão”, assegurou ao falar sobre a possível criação de um grupo territorial para avançar no diálogo.

Catadora e presidente da Cooperativa de Catadores Itairó, Silvana Bonfim, salientou que o trabalho do catador é difícil e perigoso. Ela falou sobre a necessidade de ajuda semelhante a que é oferecida pelo programa Mãos que Reciclam, da Defesnoria Pública. “Nós somos todos unidos. Não tem nenhum melhor do que o outro”, ponderou, se referindo ao grupo de catadores.

Para André Dantas, a realização da audiência é fundamental para que se perceba o quanto é possível avançar em Itapetinga com a reciclagem. Itapetinga tem uma cooperativa que nos orgulha”, avaliou.

O secretário municipal de Infraestrutura, Gustavo David, também pontuou a importância da audiência e prometeu empenho da gestão na busca de soluções para os problemas discutidos no evento. “Mas nós estamos com o compromisso firmado de, no ano que vem, nós estarmos, pelo menos, com o nosso Plano de Gerenciamento de Resíduos pronto. Isso é um objetivo que nós traçamos e eu tenho certeza que vai acontecer”, garantiu.

Representando o prefeito, Anderson Macedo reafirmou o comprometimento da gestão com a causa. “A gente tem implementado algumas medidas, pequenas ações que possam ajudar o pessoal que está na linha de frente, que são os catadores”, comunicou. Segundo ele, uma dessas ações é a doação da área para que os catadores possam ter um local adequado, onde possam trabalhar de forma digna e sair da invisibilidade.

O representante do prefeito defendeu, ainda, a criação de parcerias com instituições de ensino, como IF Baiano e Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia (Uesb), empresas privadas, Defensoria e Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social.

Conduzido pela analista de Direito da Defensoria, Taciana Andrade Miranda, houve um momento de entrega de homenagens a três pessoas que estavam na plateia e são consideradas como os catadores mais antigos de Itapetinga. “Esse evento foi feito para vocês, foi feito para que vocês fossem vistos por toda a sociedade”, explicou ao público de catadores.

O programa Mãos que Reciclam busca garantir melhores condições de trabalho e renda às catadoras e catadores de resíduo reciclável e reutilizável do estado da Bahia. São acompanhadas mais de mil famílias de catadores em diversos municípios.

A audiência pública foi transmitida ao vivo pela Fascinação AM e pelo canal TV Câmara Itapetinga no YouTube. O vídeo está disponível para acesso e compartilhamento.

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